quarta-feira, 25 de outubro de 2017

O amigo enganador

Eu te engano, ás vezes.
Mas, não como os que se enganam.
Que pensam que, de todo, te podem enganar.
Sei que um dia não mais se enganarás.
E já conheço essa parte tua.
Não és todo enganável
E então para mim olharás e verás que
                                               não me enganei.
Nesse dia verás que és igual a mim.
E não mais poderás ser assim
Enganado por ninguém.
Nem por mim, nem por você.
 E se você for tão bom quanto eu.
Nunca mais se crerá enganador de todo.
Mas saberá:
-Na verdade, eu nunca enganei ninguém,
 Nem, de todo, a ninguém enganarei ,
Mas só um pouco,
Como meu amigo fez comigo.

 Para que por um tempo
 Pare de se enganar.
 Para que descubra o seu e o meu engano.
Não digo
Que não mais me enganarei,
Ou a você.
Ou, da mesma forma,
 Que você não mais se enganará.
Mas que, dessa forma
Quando nos enganarmos,
Nos enganaremos juntos.
E saberemos quando.
Diminuindo a extensão
 E o limite de ação do engano
A nós mesmos.
Enquanto devagar
Aumentamos seu alcance
Pelo seu conhecimento
De nós mesmos
Através de nosso maior engano
O de chamarmos ao enganador
Amigo.

Para você, que é meu melhor amigo
                       e meu maior  enganador:
                           Eu.

sábado, 21 de outubro de 2017

Inverno musical dos harmônicos

As pessoas entristecem no frio.
 As cigarras dormem,
E, enquanto isso, ressonam
 Músicas inaudíveis .
Senão, àquilo que nos adoece
                                         a todos.

Logo ali.

-Vem  vamos passear por  aqueles prédios velhos.
-Ainda estão abertos?Parece tudo tão quieto.
-É feriado, ninguém está entrando ou saindo. Acho que podemos passear por lá. A maioria dos prédios fica vazia a maior parte do tempo.
Caminhamos de mãos dadas, algo me pesa nas mãos, como que aumentando o silêncio quando passamos pelas esquinas. As quadras são enormes, e penso em quantas pessoas poderiam estar morando ali ao mesmo tempo. No porquê de tantos prédios vazios.
Alguém passa gritando por nós, mas para ela é como se não fosse ninguém. Ele lê meus pensamentos, meus desejos secretos e vontades satisfeitas. Grita qualquer coisa em uma língua totalmente fundida com o ambiente e meu próprio idioma:
-A festa é mais tarde.  Não temos sequer haxixe. Vá fumar isso mais pra lá...
Paramos em frente a um monumento , é sobre um acontecimento importante. Pessoas que falavam a verdade, aumentavam o orgulho dos nativos contra os exploradores. Mas está no tempo errado, então não vemos sua glória, nem mesmo sua mensagem mais forte. Nos vamos.
A reunião da noite ficou perdida no tempo. O porque estávamos tão bem vestidos. Que energia nos havia levado de volta a frente daqueles prédios, agora fechados e com menos luz pelo lado de fora dos seus muros. Caminhamos por onde havia o vazio, e suas fundações estão agora expostas, os portais formados pelos caminhos do futuro, ainda não encobertos pela tecnologia e a força bruta, nos servem como caminho improvável ao desconhecido. Nos encostamos numa parede, tudo parece como uma teia de renda negra e cortinas de veludo cor de vinho que exalam o perfume das noites primaveris. O peso que eu tinha nas mãos está agora em qualquer lugar no solo. E nós estamos bebendo. Passamos o cálice. Da minhas mãos para as dela, das suas para as minhas.
Seus cabelos com o vento vem até minha boca. Puxo um deles com os dentes. São tão grossos, tão naturais. Seu sorriso invade meu olhar e minha mente. Nada mais importa naquele momento, mas fazê-la continuar sorrindo. Fico olhando para seus cabelos como um idiota, enquanto ela se levanta de onde estávamos recostados, e meio assentada arruma suas roupas e rendas. Queremos permanecer ali para sempre. Mas estamos do lado de fora. E está tudo fechado. Por causa da hora , sentimos aquele medo tão comum. O medo de não poder entrar. O medo que que alguém saia gritando e não tenhamos como compreender sua jornada. Será que correríamos em sua direção, para ajudar ? Ou na direção contrária , para nos salvar da sua visão, meramente? A escuridão finalmente nos toma e ouvimos o assovio, o grito, o silêncio, ouvimos os passos  e alguém que grita com autoridade. Tememos, mas enfrentando o perigo, pego o peso que estava no chão, e corremos rindo e gritando vivas e maldições, agora sobre nossos fortes e jovens pés descalços, ou calçados. Rimos do perigo e da morte. Da política e da fé. Rimos.
AHahAHahAHahAHahAHahAHahAHahAHahAHahAHahAHahAHahAHahAHahAHahAHahAHaha! -Rimos em dueto.
Nos abraçamos e continuamos nossa própria jornada rumo ao amanhecer solitário. Sabemos que o tempo nos separará, mas não sabemos quando ou quanto. Apenas damos as mão e continuamos sorrindo. Sorrindo e chorando, pela cidade ao redor.
Fim.

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Doutos e fossos

Querem os doutos da história,
Desconhecendo os fossos dos edifícios...

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Quando atrasa.

Quando o tempo se atrasa,
                para que não o veja,
Eu sempre vou até aquele pé de cereja.
Longe na minha cabeça
Único lugar onde cabe todo mundo.
Meu coração tão cheio de amor a tudo.
Que eu fiquei de fora e caí no meu próprio fígado e baço.
Os pés que para lugar nenhum caminham.
Sim, eu sei que já me confessei sobre isso.
Reclamando do brilho dourado da minha pele.
E do azul precoce dos meus olhos.
(É para esconder o ouro banhado a prata.
(E sim eu sei que isso já veio ao contrário)
Colher de prata não adianta ser banho.
Mas surpreende quando é de alumínio e platina.
Viu? Passou de novo.
Onde terá ido parar aquele socador do pilão de bronze?
E meu anel? Onde coloquei meu anel?
O relógio? A caneta tinteiro?
Isso! Tudo está perdendo a utilidade.
Há melhores escultores, agora.
Imprimem, em três dimensões, perfeiçoes horríveis.
Terríveis verdades para todos.
A obsolescência da pena.
O descaber da palavra.
A falência do segredo, escondido na música que se repete.
Nada mais é senão jabá.
A carne de cavalo seca e salgada,
 Para prevenir a fome dos sem coração.
Você vai comer isso?
Você não era vegano sexual?
Minhas unhas.
Minhas unhas nunca estariam tão feias, listradas...
Meus dedos nunca estariam assim,
Tão magros, e com calos sobre os calos.
E o tempo, que não passa.
Ainda por cima, aumentado de uma hora.
E essa hora?
5:11 horas de dez , de dezoito.
 (Mês invertido. E o ano não digo agora, por convenção anti-convenção. Nasci ás 18:30, foi o que disseram.)
Se o tempo do mundo dos sonhos é inicialmente metade do tempo acordado, e progressivamente se desacelera enquanto nos encaminhamos para camadas internas do mesmo.
 Estarei eu flutuando, sem me mover, em um lugar onde tudo parou?
Como será que está o tempo lá fora?
 Não , vocês não querem saber como está o tempo aqui dentro.
 Como é longa e inútil, a espera.
 Como é quente, neste frio sem sentido.
Nessa estrela morta para ser mais que duas.
 Esse gelo mármore, liso de se patinar
                             e onde nada se move , muito, mais lentamente, que tudo que você possa imaginar.
 E passa aquele rapaz gargalhando tão alto, com todos o levando sobre os ombros.
 Ele acha que está voando sobre eles, ou que está voando sozinho,
 Mas, ele olha para o alto e se vê entrar na janela do prédio vizinho, puxado por um fio de cabelo dourado.
 Como é possível? Ele errou de prédio? De entrada?
 Será que fui eu quem errei, e também todos estes que gritam meu júbilo?
 Não. Tudo está no seu lugar.
 Os dois castelos são meus.
 Apenas, que estou em dois lugares,
 E vejo que em um dos lados as sombras são mais escuras.
 As janelas continuam sendo de onde vem a luz mais forte.
 E tem a mesma cor dos dois lados.
 Transparente, como a verdade.
 Foi tudo consumado num tempo sem tempo.
Por isso, tudo tão lento.
Parado.
Engarrafado.
Devagar demais.
Aí.

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Porque não.

Acordou de um sonho estranho em que voava pelas montanhas de um país onde nunca estivera.
A velocidade do vôo era incomum , mesmo para os veículos mais avançados da época. Estava subindo e via um caminho de neve que se formara em um fenda da rocha. Podia sentir o ar frio, do fim de tarde, e ver ao longe, além da próxima crista topográfica, o sol poente na direção sudeste.
 Em um lance de segundos sentiu que veria uma imagem familiar, que não vira até então no voo, talvez por ainda tentar controlar as sensações daquilo, ao invés de simplesmente sentir. Mas naquele átimo de segundo, sentiu o cheiro do amor. O cheiro de água pura, talvez nunca provada por nenhum caminhante, dado o relevo.
 Era uma imagem apenas para eles, as aves, as nuvens e as estrelas do dia e da noite.  Em um instante a neve desapareceu da superfície, e seus olhos puderam contemplar a espuma que se formava entre as rochas escuras e pontiagudas. Era mesmo a água mais pura que já havia visto, e sentiu um certo pesar de não poder parar para bebê-la.
Foi neste momento que percebeu que se afastara da água, não contrariado e arrastado, mas apenas feliz com a nova direção e imagem que se descortinavam ante seus olhos. O abismo na direção oposta daquele estreito, que ficara para trás á esquerda, era um vale verde, branco e dourado, misturado com todos os lilases e violáceos alaranjados, que o magnífico ocaso lhe oferecia. Viu que não controlar o voo não era ruim, e que de alguma forma ele colaborara para tudo aquilo.
Ao se aproximar do ponto de retorno, viu o automóvel de alguém com sua companheira.
Pousou longe das vistas, mas perto, entre a vegetação.
Enquanto seus olhos fechados o traziam de volta a sua vida normal, ouvia uma voz que dizia:
-Ele olhou para a mulher?
-Não.
-Tentou saber a marca do carro ou algo que identificasse o casal?
-Também não.
-Droga... O que ele queria?
-Apenas voar.
-???
-Deixou claro que era grato, antes de se retirar, mesmo sem se identificar. Aparentemente, para deixar o casal tranquilo, com sensações anômalas que pudessem ter sido sentidas com sua aproximação, pois precisara pousar para não ter problemas no fim do sonho.
-Como eles se sentiram?
-Um pouco estranhos, mas gratos também. Como se tivessem participado de uma leve experiência para-psicológica. Sequer comentaram um com outro sobre o assunto no caminho de volta.
-Gratidão...
Abriu os olhos e continuou seu dia.
Pensava que poderia ser deus um ser que ficou escravo de um gênio, uma de suas criações enviadas ao mundo.
 Que aceitara ter muitas almas sonhadoras, para ver o que todos os seus filhos faziam na terra.
 O gênio, que lhe dera isto, era o mesmo que realizava os desejos de cada um deles, em vigília.
 A cada desejo realizado, de seus filhos acordados, ficava deus mais aprisionado.
 E a cada sonho de um de seus filhos, em que entrava, se convidado, realizava seus desejos mais felizes, e tentava conduzir os desejos deles a felicidade. Não como quem os obriga, mas como que os guia. Sim, aos que querem.
 Para que realizando sonhos gratos, sejam livres.
 E assim , quem sabe um dia, também tal deus e ele mesmo, um de seus filhos, ficaria livre.
 Tentava não abusar nem mesmo dos sonhos. E acordava sempre grato.
-Enquanto for grato e modesto, deixe-o continuar voando.
-Como se pudéssemos impedi-lo... (risos)
Fim.

















Confiança

Você pode confiar em uma pessoa ou em todas as pessoas.
Pois nunca , seja lá o que uma pessoa diga ou pense de si mesmo
Terá todo a mesma opinião .
E se todos pensarem de alguém o mesmo.
A mesma pessoa, de fato, nunca concordará.

Desastre

Desmatamento.
Exploração.
Gado.
Morte.
Chuva.
Erosão.
Assoreamento lento do leito.
Estagnação.
Ganância.
Engarrafamento.
Poluição.
Sorte?
Deserto.
Tempo sem tempo.
E tudo finalmente se torna como são os seus.

Tempo , espaço e daí.

Se você me pedir do jeito certo.
Te ouvirei,
Mesmo que não diga.
Te sentirei a verdade,
Mesmo que não a saiba antes.
Te atenderei à porta,
Mesmo sem mesmo estar perto.
E, pelo tempo que precisar,
Serei teu oásis.
Na montanha ou no deserto.
Quando tudo e todos ao redor estiverem distantes.
Quando nada lhe disser que fique, ou siga.
Ou até quando quiser fugir de toda essa liberdade
                                                       que desde sempre,
Lhe aprisiona o peito.