domingo, 31 de julho de 2016

O ANO ERA 1988

Eu matava aula. Ia pra praia.
Longe, cedo, e com meninos mais velhos.
Todos vínhamos de São Gonçalo para Niterói.
O Zé Pequeno, o Pierre, o Pantera, o Simão Português, e eu que era o Junior.
Chegamos na praia e o mar estava calmo.
Não era matação de aula, pois era sábado.
Minha  mãe nunca me deixava ir a praia sozinho. Era a primeira vez.
A pedra da baleia lá.
Nadamos até a barriga.
Subimos pelo lado, em escadas precárias, e sem olhar para baixo entre os vãos.
Chegamos ás costas e caminhamos até a cabeça.
Estranhamente todos os outros sumiram.
E agora estamos só eu o Pierre e o Zé.
O Pierre sentiu alguma coisa.
"Não vou descer por aí. Vou pelo lado mais baixo, e dar a volta."
O céu estava limpo, mas agora está escuro.
O zé me pressiona:
"Vai ou não vai , Júnior?''
"Tá , eu vou, mas vai você na frente."
E lá se foi o zé.
Quando olhei para trás , o Pierre também tinha ido.
Lembrei que uma vez tinha xingado o mar. Me arrependi. Teria pedido perdão.
Lembrei que não tinha como descer pelas escadas de subir.
Frio. Medo. Raiva de ter ficado ali sozinho no alto daquela "baleia".
"O que estou fazendo aqui?"
Olho para baixo.
Dou dois passos para trás e dois passos pra frente.
O terceiro, já um salto no vácuo.
Me lembro de tentar voar.
Me lembro de ver o ponto preto que crescia.
Como dá pra ver tudo daqui de cima.
Cabeça.
Pés.
Cabeça
Pernas.
Cabeça.
Barriga.
Cabeça.
Peito.
Pow.
Cabeça, cabeça, cabeça.
"Nada , Zé, nada..."
"Nunca mais vai ser o mesmo, Zé."
"Arrota, Zé."
"E o Junior?"
"Acho que foi pra casa sozinho."
"Que cara maluco, caiu em cima da minha cabeça, com a bunda nas minhas costas, nem sei como não morremos!"
"Você gosta de criança?"- Perguntava o André.
"NÃO CARA, EU ERA A CRIANÇA."
"Não, eu tomava conta de crianças. Mas nunca me senti diferente delas. Nem queria ser como elas, só queria comer a merenda junto, pois minha merenda não era boa quando eu era criança, e tinha a história da banana podre na igreja..."
"Você é Jack?"
''Não, eu não sei como era o nome dela."
"Ela era minha babá, me batia e abusava de mim. Só me lembro de flashes. A vagina era do tamanho do meu rosto e cabia meu braço dentro."
"Pára de chorar. É suco de maracujá, você não gosta?"
"Você não gosta?"
"Você não gosta?"
"Você não gosta?"
Queria ter dito não.
Não. Entende?
É o que eu digo sempre.
Não.
Mas nunca entendem um não...
Nunca.
"O NOME DESSA FRATURA NO SEU PEITO É FRATURA DE ROSÁRIO, E NÃO DEVERIA EXISTIR UMA NATURAL, PELO MENOS ´HÁ MUITO TEMPO, POIS EU NUNCA VI UMA NA VIDA."

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